Tuesday, July 15, 2008

O meu percurso pelo Oberdieck Garten em Freising


Fonte: http://www.fh-weihenstephan.de

O jardim Oberdieck faz parte do conjunto de jardins experimentais de Weihenstephan criado em 1828 para o desenvolvimento da pesquisa, estudo, cultivo e manutenção de espécies vegetais. Em 1923 o jardim foi redesenhado pelo arquiteto-paisagista Carl Wilczek e recebeu o nome do pomólogo Johann Gerd Conrad Oberdieck (1794 - 1880).

Com o passar do tempo, o espaço foi sendo transformado e deu lugar a jardins temáticos:
jardim do camponês (Bauerngarten), jardim medicinal (Apothekergarten), jardim dos cegos (Blindengarten), jardim de plantas corantes (Färberpflanzen), etc. A diversidade de temas e espécies fez com que a fluidez e a generosidade do desenho original do jardim fossem modificadas. O tema de uma possível reforma gerou polêmica: de um lado os que admiravam a variedade de espécies e a pluralidade de idéias dos jardins temáticos e não gostariam de tê-los modificados e do outro aqueles que desejavam recuperar as intenções do desenho idealizado por Carl Wilczek, e por isso ansiavam por uma reforma.

Em 2005 decidiu-se - devido ao mau-estado de conservação das escadas e caminhos, e por conta do difícil controle das espécies vegetais invasoras no lado sul do morro - realizar a reforma geral de toda a área. A idéia então era reinterpretar o desenho original de Carl Wilczek.

Como eu não conhecia o jardim antes da sua reforma, eu não posso comparar o que ele era com o que eu vi há duas semanas na ocasião de sua inauguração. Mas vou nesse texto tentar descrever as minhas sensações ao passear pelo Oberdieck Garten. Esse é um primeiro exercício: pretendo, através da descrição de diferentes lugares, reconhecer o que para mim distingue um espaço harmônico de um espaço conflictante.


Fonte: http://www.fh-weihenstephan.de

A primeira coisa que me chamou atenção na estruturação espacial do jardim foi a sua topografia. Eu me aproximei do jardim ao descer a montanha em direção à cidade. À minha direita um portão me conduziu ao seu platô mais alto. Do meu ângulo de visão no platô superior, eu não consegui ver todo o jardim - devido a arbustos que separam o primeiro terraço do segundo. Fiquei nas pontas dos pés e não consegui ver mais. Subi no banco e também não tive a visão que esperava. Se por um lado isso me deixou um pouco frustrada, por outro lado eu fiquei curiosa para descobrir o resto.



Segui então pelo caminho do meio e fui andando entre os canteiros. Os canteiros estavam abertos, com muita grama e só possuíam plantas nas bordas. E foi então que notei que as plantas não eram nada de especial (eram quase ervas-daninhas), espécies que podem ser encontradas em qualquer terreno abandonado. No primeiro momento fiquei confusa porque não era possível os arquitetos-paisagistas terem eleito tais espécies - que nem possuem flores - para o jardim. Tanto verde sem nenhum contraste é monótono, não poderia ser proposital. E foi então que eu percebi que o jardim ainda não estava pronto. As plantas estavam fazendo o papel de um fertilizante natural para o solo que posteriormente receberia outras espécies mais nobres.

No próximo canteiro, ainda no platô superior, havia flores nas bordas. Os tons eram alegres: diversos tons de rosa, roxo e lilás. Abaixei para cheirar algumas dessas flores, que de fato, eram perfumadas.



E então eu segui à esquerda, alcançando o portão central do jardim, que dá acesso para a viela que une a Fachhochschule à cidade. De costas para o portão e de frente para o poço de água eu subi alguns degraus de escada e vi a perspectiva mais bonita até então. À esquerda uma árvore com seus galhos e folhas redondas formando uma espécie de guarda-chuva sobre a minha cabeça; à minha direita canteiros com espécies diversas e uma linha de arbustos separando o resto do jardim desse segundo terraço, o que tornava o espaço mais íntimo e acolhedor; e à minha frente os elementos - o poço de água e a árvore no patamar de cima alinhados num eixo - canalizavam numa só percepção: eu me sinto bem. Nessa hora eu percebi que eu sorri. Foi como se o meu corpo e o meu rosto se abrissem para o espetáculo que estava sendo apresentado frente aos meus olhos. O poço de água, em formato quadrado, imediatamente me assaltou com uma sensação refrescante. A temperatura nesse lugar equilibrou uma mensagem sensorial que eu tinha recebido no platô superior, cuja temperatura era mais alta, pois quase nao havia sombra. Nesse ponto eu percebi que o contraste é um tema muito importante no jardim: o platô de cima era aberto, ensolarado, colorido, movimentado, direto; o platô inferior com o poço de água era íntimo, acolhedor, misterioso, refrescante, sereno.







Ao fundo, reinando absoluta, uma Tília corpulenta e generosa. Em volta do seu tronco, emoldurado pelo azul do céu, um banco branco, fazendo um convite: venha, aqui tem mais coisa para descobrir.

Antes de aceitar o convite eu fiquei parada nesse ponto, e olhei de novo todos os elementos com cuidado. Era como se eu estivesse num ponto-chave, assim como os pontos de acupuntura no corpo humano. Em pé, nessa posição, era como se eu recebesse de presente desse lugar uma energia que não tem nome. Tudo em equilíbrio: a temperatura, a oferenda, a clareza, a intimidade, o pulso, a generosidade.

Estando no segundo platô, ao olhar para o terceiro platô eu percebo a imponência da fachada do edifício da Fachhochschule emoldurando o jardim.



Se por um lado o espaço com o poço me chamava para relaxar e respirar o ar fresco, a árvore me convidava a descobrir.



Esse contraste de ofertas tem algo de muito vivo. Tudo está acontecendo naquele exato momento. Assim como tudo que é vivo, aquele momento só existe em si mesmo, não importa nem antes, nem depois. Este poço me deu a impressão de ser o coração do jardim, o meio de tudo, para onde todas as forças são canalizadas, neutralizadas e ao mesmo tempo intensificadas.

Aceitando a oferta da árvore, eu atravessei o terraço central e subi três ou quatro degraus. Diante dos meus olhos abriu-se uma grande vastidão. Era possível ver a paisagem abrindo-se até Munique. Se o tempo estivesse mais seco, daria para eu enxergar os alpes bávaros. Fiquei um tempo descansando o olhar sobre tamanha abertura, deslumbrada pela quantidade de árvores que a cidade tem até chegar ao aeroporto, que se vê ao fundo, e pela amplidão dos campos de milho, cevada, canola, beterraba da Münchner Schotterebene (Planície aluvial de Munique), que parece extender-se até a linha do horizonte.

Quando me voltei para a árvore, a única coisa que eu conseguia sentir era gratidão. Olhei para seu tronco atentamente: uma árvore antiga, que já testemunhou muita coisa. Ela já estava ali muito antes de eu nascer e vai continuar por muitas dezenas de anos depois que eu morrer.



Tomei então o caminho à minha direita e desci um grupo de escadas até alcançar o terceiro platô, o mais baixo. Essas escadas são intercaladas com os caminhos e não estão todas na mesma posição. Isso dá movimento ao conjunto. Muros de uma pedra em tom amarelo-claro emolduram as escadas, cuja largura não ultrapassa 1.50m - a escala usada aqui é humana, proporcional ao usuário e não a um grande grupo de pessoas. As escadas acomodam-se no terreno, respeitando a topografia do lugar.



O terceiro platô impressiona pelo verde reluzente de um gramado de trevos. Na foto, ao olhar do segundo platô para o terceiro platô, a posição das árvores parece dar ênfase à percepção de que o terceiro platô está descendo. No entanto, espacialmente, esse terraço não transmite a clareza que eu senti nos demais terraços. Há duas linhas de macieiras que descem o platô em direção a uma pequena praça - que é a outra porta de entrada do jardim. As macieiras são ainda muito jovens. Nesse ponto eu fico me perguntando qual teria sido a intenção do autor do projeto: ela não me é legível. Ainda é possível ver a majestosa fachada do antigo prédio da Fachhochschule ao fundo. No entanto, quando as macieiras crescerem, acho que essa visão será dificultada.



Juntamente com o Hofgarten e o Buchsgarten, este é mais um espaço livre na Weihenstephaner Berg onde os usuários - moradores e turistas - podem desfrutar de um Lugar.

Nesse jardim eu posso apreciar a paisagem de cima do morro, eu posso descobrir nomes e cheiros de flores, eu posso sentar na sombra de uma árvore e ficar apreciando o reflexo das plantas e do céu num poço d'água, eu posso deitar numa pedra quente, fechar os olhos e deixar o sol esquentar a minha pele, eu posso ver a chuva cair debaixo de uma generosa Tília... enfim, são muitas ofertas e possibilidades que me são generosamente oferecidas: venha e sinta-se bem.

1 comment:

same-same said...

great project (& thanks for your comment on my blog)..greets, h