Monday, July 28, 2008

Horst Rittel - segundo texto de Peter Schwehr

Texto de Peter Schwehr*:

Segundo Rittel, o conhecimento é a base de qualquer ação ou decisão.

Quem age, precisa conhecer:
• aquilo que é a questão (conhecimento fático);
• aquilo que a questão deveria ser ou deveria tornar-se (conhecimento deôntico, ideológico, visionário);
• como a questão pode ser modificada (conhecimento instrumental);
• as conseqüências (ou as conseqüências prováveis) e os motivos de uma questão (conhecimento explicativo, justificativo).

O conhecimento instrumental pressupõe o conhecimento fático e o conhecimento explicativo. A estruturação da área do conhecimento através da formulação de perguntas possibilita a criação de um campo de saber que é necessário para a solução de problemas (por exemplo normas e conhecimento técnicos). A combinação de diversas áreas de conhecimento permite gerar soluções para as tarefas postuladas.

Ao reconhecer o problema, o planejador usará, de um lado, a sua própria competência e experiência profissional (interno) e, de outro lado, ele procurará conscientemente, fora do seu repertório existente (externo), informações capazes de auxiliá-lo na solução do problema.

Tanto as informações externas quanto as internas serão filtradas, avaliadas e organizadas num contexto. Isso requer, além da capacidade de percepção, análise e interpretação, o esforço de ordenar as informações segundo temas diferentes, propondo as interrelações entre elas. A ativação da capacidade individual de associação - segundo Zumthor, a "inspiração" («die Eingebung») - compreende a combinação de diferentes noções arquitetônicas e a concepção de variedade.

"Projetar significa em grande parte entender e ordenar. No entanto, é apenas através da emoção e da intuição que emerge o verdadeiro cerne da arquitetura que se busca, penso eu" (Peter Zumthor, 1998).

Desse modo, a ação criativa é marcada de emoções e inspirações. Entretanto, só agir de modo criativo não basta; um edifício, que não cumpre suas funções (técnicas, urbanísticas e de uso) não pode ser considerado um resultado bem-sucedido do processo projetual. O arquiteto deve ser capaz de estimar as conseqüências das suas escolhas e decisões. Isto requer um pensamento interdisciplinar no qual ele deve levar em consideração as demais disciplinas (engenharia civil, engenharia hidráulica, etc.) envolvidas no processo de concepção de um edifício. Nesse ponto, a idéia do espaço imaginado é abandonada para que as variáveis fixas sejam discutidas entre os especialistas no nível do planejamento real.

O arquiteto irá, entrando em acordo com o seu cliente, eleger as variantes projetuais mais adequadas. Os critérios de eleição, bem como a tomada de decisão final, são uma opção individual do planejador - e por conta disso não-objetiva. Tais critérios são separados dos critérios dos demais participantes do projeto intersubjetivamente. O arquiteto deve então assumir a responsabilidade pela sua decisão e não pode ter uma posição neutra.

*Esse texto foi livremente traduzido do capítulo 3 da tese de doutorado de Peter Schwehr: Lösungsvarianten im Entwurfsprozess em "Ein entwurfsbezogenes Orientierungssystem : Analysieren, Speichern und Aufrufen von entwurfsbedingter Information in erlebter und publizierter Architektur", 2004. A tese pode ser baixada do endereço: http://elib.uni-stuttgart.de/opus/frontdoor.php?source_opus=1966&la=de

Peter Zumthor e ato de projetar

«Der Vorgang des Entwerfens beruht auf einem ständigen Zusammenspiel von Gefühl und Verstand. Die Gefühle, die Vorlieben, Sehnsüchte und Begierden, die aufkommen und Form werden wollen, sind mit kritischem Verstand zu prüfen. Ob abstrakte Überlegungen stimmig sind, sagt uns das Gefühl.»

"O ato de projetar baseia-se no contínuo jogo entre sentimento e razão. Os sentimentos, os afetos, as aspirações e os desejos que surgem e devem transformar-se em forma, precisam ser colocados à prova pela razão crítica. Se as reflexões abstratas são coerentes, nos diz a nossa sensibilidade".

Thursday, July 17, 2008

Lyon Confluence


Fonte: http://www.aroots.org/

Vou visitar o Projeto Lyon Confluence na segunda semana de Agosto e analisar o projeto segundo uma lista de critérios e parâmetros que eu estou montando.
Lyon é um dos meus estudos de caso.

No site do projeto, o texto de abertura diz:

"Lyon Confluence, major urban project"

"Long given over to industry and transport, this territory to the south of Lyon's Presqu'île district is now undergoing radical change. Reclaimed in the past from the Rhône and Saône, the site is now returning to its riverbanks and natural setting, with ongoing development highlighting a remarkable space and its unique landscapes. Ultimately the project will double the area of Greater Lyon's hypercentre : a rare achievement in Europe, a real challenge for the metropolis and a great opportunity for residents."

O plano Lyon Confluence deve ser realizado em três fases:

  • Fase 1 (2003–15): Nesta fase do projeto uma área de 41 hectares de área será replanejada. Com essa mudança, um novo bairro surgirá, próximo ao centro da cidade de Lyon. Em 2009 pretende-se liberar os setores Place Nautique e Place d'Archives.
  • Fase 2 (em estudo): A segunda fase deverá envolver um território de 20 a 25 hectares, onde hoje encontra-se o mercado atacadista e uma linha de trem ainda em uso. Paralelamente, as prisões serão removidas da área em 2009-10.
  • Planejamento a longo prazo (2025/2030): a longo prazo, a uniformidade, a altura e a densidade dos blocos deverão estar em conformidade com o resto das edificações da península, assim como a diversidade das funções oferecidas pelos prédios. Os rios, as áreas verdes, as docas, os cais e as bacias internas deverão formar uma extensa rede verde/azul, que, além de diferenciar o Rhône do Saône, garantirá uma unidade ao conjunto e aumentará o apelo a espaços e paisagens públicas. A essa altura, graças aos novos contornos rodoviários e ferroviários de Lyon, a auto-estrada terá sido redesenhada e as linhas férreas reduzidas.

A Pattern Language

A pattern language, 1977 *

É o livro mais conhecido de Alexander. Nesse livro o autor sugere 253 padrões que formam uma linguagem que pode ser usada na concepção de espaços. O autor começa falando sobre região, depois vai ficando mais específico e fala da cidade, do bairro, do edifício, da construção, até chegar nos detalhes. Cada padrão é descrito segundo o seu conflito, a sua solução e a sua justificativa. Todos os padrões são interconectados entre si através de uma linguagem. Para cada padrão há padrões associados, tanto os mais detalhados (sub-padrões), quanto os mais gerais.

Alexander procura inspirar os planejadores a construir uma linguagem própria (o que é geralmente ignorado pelos seus críticos). Os padrões sugeridos por ele devem ser interpretados como sugestões. A partir dos padrões sugeridos, é possível completá-los e reconstruí-los segundo as especificidades de cada lugar.

A discussão do Processo de Construção sugerido por Alexander é muito controverso entre os intelectuais. Alexander dá ênfase ao "desenho in loco" numa escala 1:1, criticando aqueles que desenham sobre uma folha de papel.

* tradução livre do texto de Dirk Donath
http://gonzo.uni-weimar.de/~donath/c-alexander98/ca98-html.htm

A percepção da paisagem e o ensino do paisagismo segundo Peter Latz


Segundo Peter Latz: "A paisagem só existe na nossa cabeça. Cada pessoa a percebe e a monta mentalmente de uma maneira particular. Ou seja, é uma construção mental que cada indivíduo cria da sua própria maneira. (...) Diversos padrões de associação são ativados concomitantemente ao processo concreto de percepção de uma paisagem, influenciando crucialmente a percepção do espaço e a sua interpretação. (...) Não seria a lembrança de um gramado florido com seu perfume, o cantar dos pássaros ou o ar doce que nos leva a consider bela uma paisagem? Não seria o frio que queima o rosto, o vento fresco que sopra nos cabelos, a neve pulverizada que cobre os sapatos que nos fazem sentir que estamos gozando de uma paisagem bonita? O espaço não existe acima de tudo para nos possibilitar a vivência de experiências?".

No livro "The Syntax Of Landscape,The Landscape Architecture of Peter Latz and Partners", Udo Weilacher escreve:

"Uma das dificuldades básicas da atualidade, cuja percepção é fortemente marcada pelo visual (...), é tornar possível a compreensão de que a paisagem não existe apenas no plano visual. Muito mais do que um cenário, ela é uma soma de supostamente infinitos componentes, muitos deles invisíveis, que são intimamente interdependentes e marcam a essência, o signficado e a percepção. (...) "

"Peter Latz entende a paisagem como um arranjo espacial construído, que está em constante e dinâmica transformação - e é freqüêntemente influenciado por interações imprevisíveis -, e nunca atinge um estágio-clímax definitivo e estático".

"Para Peter Latz, o Paisagismo não é apenas uma ciência que dedica-se à produção do ambiente construído e suas associações - e seus alunos tiram proveito desta visão de amplos horizontes. Como não é possível a profissão abarcar todos os campos, para suprir de maneira diferenciada os temas paisagísticos que são relavantes para o arquiteto-paisagista, é importante que haja um trabalho conjunto interdisciplinar no ensino universitário da profissão em que disciplinas vizinhas sejam combinadas à grade curricular do aluno - tais como a engenharia florestal, a dendrologia, a geobotânica, a ecologia, a arquitetura, a engenharia civil, o urbanismo e outras."

Tuesday, July 15, 2008

O meu percurso pelo Oberdieck Garten em Freising


Fonte: http://www.fh-weihenstephan.de

O jardim Oberdieck faz parte do conjunto de jardins experimentais de Weihenstephan criado em 1828 para o desenvolvimento da pesquisa, estudo, cultivo e manutenção de espécies vegetais. Em 1923 o jardim foi redesenhado pelo arquiteto-paisagista Carl Wilczek e recebeu o nome do pomólogo Johann Gerd Conrad Oberdieck (1794 - 1880).

Com o passar do tempo, o espaço foi sendo transformado e deu lugar a jardins temáticos:
jardim do camponês (Bauerngarten), jardim medicinal (Apothekergarten), jardim dos cegos (Blindengarten), jardim de plantas corantes (Färberpflanzen), etc. A diversidade de temas e espécies fez com que a fluidez e a generosidade do desenho original do jardim fossem modificadas. O tema de uma possível reforma gerou polêmica: de um lado os que admiravam a variedade de espécies e a pluralidade de idéias dos jardins temáticos e não gostariam de tê-los modificados e do outro aqueles que desejavam recuperar as intenções do desenho idealizado por Carl Wilczek, e por isso ansiavam por uma reforma.

Em 2005 decidiu-se - devido ao mau-estado de conservação das escadas e caminhos, e por conta do difícil controle das espécies vegetais invasoras no lado sul do morro - realizar a reforma geral de toda a área. A idéia então era reinterpretar o desenho original de Carl Wilczek.

Como eu não conhecia o jardim antes da sua reforma, eu não posso comparar o que ele era com o que eu vi há duas semanas na ocasião de sua inauguração. Mas vou nesse texto tentar descrever as minhas sensações ao passear pelo Oberdieck Garten. Esse é um primeiro exercício: pretendo, através da descrição de diferentes lugares, reconhecer o que para mim distingue um espaço harmônico de um espaço conflictante.


Fonte: http://www.fh-weihenstephan.de

A primeira coisa que me chamou atenção na estruturação espacial do jardim foi a sua topografia. Eu me aproximei do jardim ao descer a montanha em direção à cidade. À minha direita um portão me conduziu ao seu platô mais alto. Do meu ângulo de visão no platô superior, eu não consegui ver todo o jardim - devido a arbustos que separam o primeiro terraço do segundo. Fiquei nas pontas dos pés e não consegui ver mais. Subi no banco e também não tive a visão que esperava. Se por um lado isso me deixou um pouco frustrada, por outro lado eu fiquei curiosa para descobrir o resto.



Segui então pelo caminho do meio e fui andando entre os canteiros. Os canteiros estavam abertos, com muita grama e só possuíam plantas nas bordas. E foi então que notei que as plantas não eram nada de especial (eram quase ervas-daninhas), espécies que podem ser encontradas em qualquer terreno abandonado. No primeiro momento fiquei confusa porque não era possível os arquitetos-paisagistas terem eleito tais espécies - que nem possuem flores - para o jardim. Tanto verde sem nenhum contraste é monótono, não poderia ser proposital. E foi então que eu percebi que o jardim ainda não estava pronto. As plantas estavam fazendo o papel de um fertilizante natural para o solo que posteriormente receberia outras espécies mais nobres.

No próximo canteiro, ainda no platô superior, havia flores nas bordas. Os tons eram alegres: diversos tons de rosa, roxo e lilás. Abaixei para cheirar algumas dessas flores, que de fato, eram perfumadas.



E então eu segui à esquerda, alcançando o portão central do jardim, que dá acesso para a viela que une a Fachhochschule à cidade. De costas para o portão e de frente para o poço de água eu subi alguns degraus de escada e vi a perspectiva mais bonita até então. À esquerda uma árvore com seus galhos e folhas redondas formando uma espécie de guarda-chuva sobre a minha cabeça; à minha direita canteiros com espécies diversas e uma linha de arbustos separando o resto do jardim desse segundo terraço, o que tornava o espaço mais íntimo e acolhedor; e à minha frente os elementos - o poço de água e a árvore no patamar de cima alinhados num eixo - canalizavam numa só percepção: eu me sinto bem. Nessa hora eu percebi que eu sorri. Foi como se o meu corpo e o meu rosto se abrissem para o espetáculo que estava sendo apresentado frente aos meus olhos. O poço de água, em formato quadrado, imediatamente me assaltou com uma sensação refrescante. A temperatura nesse lugar equilibrou uma mensagem sensorial que eu tinha recebido no platô superior, cuja temperatura era mais alta, pois quase nao havia sombra. Nesse ponto eu percebi que o contraste é um tema muito importante no jardim: o platô de cima era aberto, ensolarado, colorido, movimentado, direto; o platô inferior com o poço de água era íntimo, acolhedor, misterioso, refrescante, sereno.







Ao fundo, reinando absoluta, uma Tília corpulenta e generosa. Em volta do seu tronco, emoldurado pelo azul do céu, um banco branco, fazendo um convite: venha, aqui tem mais coisa para descobrir.

Antes de aceitar o convite eu fiquei parada nesse ponto, e olhei de novo todos os elementos com cuidado. Era como se eu estivesse num ponto-chave, assim como os pontos de acupuntura no corpo humano. Em pé, nessa posição, era como se eu recebesse de presente desse lugar uma energia que não tem nome. Tudo em equilíbrio: a temperatura, a oferenda, a clareza, a intimidade, o pulso, a generosidade.

Estando no segundo platô, ao olhar para o terceiro platô eu percebo a imponência da fachada do edifício da Fachhochschule emoldurando o jardim.



Se por um lado o espaço com o poço me chamava para relaxar e respirar o ar fresco, a árvore me convidava a descobrir.



Esse contraste de ofertas tem algo de muito vivo. Tudo está acontecendo naquele exato momento. Assim como tudo que é vivo, aquele momento só existe em si mesmo, não importa nem antes, nem depois. Este poço me deu a impressão de ser o coração do jardim, o meio de tudo, para onde todas as forças são canalizadas, neutralizadas e ao mesmo tempo intensificadas.

Aceitando a oferta da árvore, eu atravessei o terraço central e subi três ou quatro degraus. Diante dos meus olhos abriu-se uma grande vastidão. Era possível ver a paisagem abrindo-se até Munique. Se o tempo estivesse mais seco, daria para eu enxergar os alpes bávaros. Fiquei um tempo descansando o olhar sobre tamanha abertura, deslumbrada pela quantidade de árvores que a cidade tem até chegar ao aeroporto, que se vê ao fundo, e pela amplidão dos campos de milho, cevada, canola, beterraba da Münchner Schotterebene (Planície aluvial de Munique), que parece extender-se até a linha do horizonte.

Quando me voltei para a árvore, a única coisa que eu conseguia sentir era gratidão. Olhei para seu tronco atentamente: uma árvore antiga, que já testemunhou muita coisa. Ela já estava ali muito antes de eu nascer e vai continuar por muitas dezenas de anos depois que eu morrer.



Tomei então o caminho à minha direita e desci um grupo de escadas até alcançar o terceiro platô, o mais baixo. Essas escadas são intercaladas com os caminhos e não estão todas na mesma posição. Isso dá movimento ao conjunto. Muros de uma pedra em tom amarelo-claro emolduram as escadas, cuja largura não ultrapassa 1.50m - a escala usada aqui é humana, proporcional ao usuário e não a um grande grupo de pessoas. As escadas acomodam-se no terreno, respeitando a topografia do lugar.



O terceiro platô impressiona pelo verde reluzente de um gramado de trevos. Na foto, ao olhar do segundo platô para o terceiro platô, a posição das árvores parece dar ênfase à percepção de que o terceiro platô está descendo. No entanto, espacialmente, esse terraço não transmite a clareza que eu senti nos demais terraços. Há duas linhas de macieiras que descem o platô em direção a uma pequena praça - que é a outra porta de entrada do jardim. As macieiras são ainda muito jovens. Nesse ponto eu fico me perguntando qual teria sido a intenção do autor do projeto: ela não me é legível. Ainda é possível ver a majestosa fachada do antigo prédio da Fachhochschule ao fundo. No entanto, quando as macieiras crescerem, acho que essa visão será dificultada.



Juntamente com o Hofgarten e o Buchsgarten, este é mais um espaço livre na Weihenstephaner Berg onde os usuários - moradores e turistas - podem desfrutar de um Lugar.

Nesse jardim eu posso apreciar a paisagem de cima do morro, eu posso descobrir nomes e cheiros de flores, eu posso sentar na sombra de uma árvore e ficar apreciando o reflexo das plantas e do céu num poço d'água, eu posso deitar numa pedra quente, fechar os olhos e deixar o sol esquentar a minha pele, eu posso ver a chuva cair debaixo de uma generosa Tília... enfim, são muitas ofertas e possibilidades que me são generosamente oferecidas: venha e sinta-se bem.

A harmonia de um lugar

A harmonia gerada pela composição espacial de um determinado lugar é uma qualidade que distingue um determinado espaço de outros que não são capazes de transmitir a mesma coerência. Nem todos os espaços são igualmente verdadeiros e coerentes com a sua própria natureza - assim como nem todos os seres humanos são verdadeiros e coerentes com si mesmos. Por isso, ao encontrar espaços ou pessoas que transmitem essa coerência, sentimos-nos bem.

E para isso não é preciso ter lido livros ou freqüentado cursos. Não é preciso nenhum exercício mental. Sem qualquer esforço, qualquer pessoa é capaz de perceber essa coerência imediatamente, como se já a conhecêsse há muitos e muitos anos e só precisasse de um sinal para relembrar-se de que ela existe.

Num lugar capaz de transmitir harmonia, vivenciamos o que se pode chamar de paz: tudo está no seu devido lugar. Não há nada forçado, tenso, deslocado, preso ou artificial; pelo contrário, a mensagem que é captada por qualquer ser humano que encontra-se num lugar harmônico diz:

equilibrado
generoso
franco
aberto
vivo
justo
livre
fluido
flexível
inteiro
coerente
inspirador
sereno
perfeito

Como qualquer ser humano pode reconhecer um espaço harmônico, numa tempestade de idéias (brainstorming) eu poderia facilmente reunir mais palavras que ajudariam a iluminar outros aspectos que são incitados por esta qualidade do lugar e que eu não citei aqui.

O que eu estou chamando aqui de harmonia, Christopher Alexander denominou a qualidade sem nome: "verdade essencial que satisfaz as necessidades humanas e inclui aspectos como perfeição, harmonia e adaptabilidade”.

Wednesday, July 9, 2008

The Timeless Way of Building

Este é o título de um dos livros de Christopher Alexander.
Ao ler o livro, é como se eu me lembrasse de coisas que inconscientemente eu já sei, mas que eu nunca tinha lido em nenhum outro lugar com uma linguagem tão clara como a usada por Alexander. Tenho certeza de que a metodologia que eu vou desenvolver no meu doutorado terá relação com a linguagem dos padrões criada por ele.

* * *

Na tentativa de explicar a "maneira atemporal" de construir, o autor divide o livro em três partes: a qualidade central, o portal e a maneira atemporal.

- a Qualidade. Neste bloco Alexander fala numa qualidade que é objetiva e precisa, mas que não tem um nome. Esta qualidade é o principal critério da vida de um homem, de uma cidade, de um edifício ou de uma floresta. É o que todo e qualquer ser humano busca primordialmente: momentos e situações em que se sinta vivo.
Para definir esta qualidade em edifícios ou em cidades, é necessário começar por entender que todo o lugar tem o seu caráter definido por determinados padrões de eventos que são reincidentes. Tais padrões podem estar vivos ou mortos. À medida em que estão vivos, têm o poder de liberar nossas forças internas e nos tornar livres. Quando estão mortos, nos mantêm presos em nossos conflitos internos.
Quanto mais padrões vivos há em um dado espaço, mais ele funciona segundo um todo e mais ele tem o fogo auto-regulador que o mantém vivo. Quando um edifício possui esse fogo, então ele passa a fazer parte da natureza e a ser governado por um jogo infinito de repetição e variação, criado na presença do fato que todas as coisas são passageiras.

- o Portal. Para alcançar a qualidade sem nome é preciso construir uma linguagem de padrões viva, que funcione como um portal. Tal qualidade não pode ser feita, mas apenas gerada indiretamente, através de ações ordinárias de pessoas.
As pessoas podem construir casas por si mesmas e têm feito isto por centenas de anos, usando o que Alexander chama de linguagens de padrões. Uma linguagem de padrões dá a qualquer pessoa o poder de criar uma variedade infinita de novos e únicos edifícios, assim como a linguagem ordinária dá o poder de criar uma variedade infinita de frases.
No entanto, o domínio desta linguagem não resulta necessariamente em edifícios vivos.
Houve uma interrupção no uso da linguagem em nossos tempos. Como os padrões não são mais compartilhados, o processo pelo qual eles são mantidos vivos foi interrompido, de modo que hoje é virtualmente impossível para qualquer pessoa, na atualidade, fazer um edifício vivo.
Para recuperarmos uma linguagem viva e que possa ser compartilhada, nós precisamos aprender a redescobrir os padrões que possuem vida e que podem gerar vida.
Ao testar tais padrões através da experiência, nós podemos determinar, de uma maneira muito simples, quais os padrões capazes de gerar vida ou não - à medida que reconhecemos como nos sentimos perante eles.

- a Maneira Atemporal. Uma vez construído o portal, é possível passar por ele através da prática da maneira atemporal. Se há uma linguagem de padrões comum em uma cidade, as pessoas devem ter o instrumento e o poder que precisam nas mãos para fazer ruas e casas vivas, através das mais ordinárias ações.
A linguagem, assim como uma semente, é o sistema genético que vive de milhões de atos pequenos e que tem o poder de formar um todo.
Através deste processo, cada ato individual é um processo no qual o espaço gerado torna-se diferenciado. Não se trata de um processo de adição, no qual as partes pré-formadas são recombinadas para formar o todo, mas de um processo de desdobramento, como a evolução de um embrião, no qual o todo precede as partes, e dá vida a elas.
O processo de desdobramento acontece passo a passo, com um padrão de cada vez. Cada passo dá vida a um só padrão; e a intensidade do resultado depende da intensidade de cada um desses passos individuais.
De uma seqüência de padrões individuais, edifícios inteiros com um caráter natural serão criados segundo seus pensamentos, com a facilidade que se cria frases. Tais ediícios podem ser construídos diretamente, sem a necessidade do uso de desenhos. Diversos atos de construção e reconstrução gerarão lentamente um todo maior e mais complexo que cada ato poderia gerar individualmente. Milhões de atos construtivos individuais gerarão conjuntamente uma cidade viva, e imprevisível.



The Timeless way of building, 1979* (tradução livre do texto de Dirk Donath)

http://gonzo.uni-weimar.de/~donath/c-alexander98/ca98-html.htm

Esse livro descreve a "qualidade sem nome". Ao terminar a síntese do livro "A Pattern Language", Alexander tenta examinar o planejamento e o projeto como um processo fundamental e universal. O autor descreve então a "fabricação" de um "todo", que possui uma "qualidade sem nome".

Os temas tratados no livro são:

a qualidade: o portal o caminho
... é objetiva e precisoa, mas não pode ser nomeada,

está ligada às ações cotidianas do ser humano,

é uma parte de nós, é parte da natureza,

é determinante para que nos sintamos bem e livres.

uma linguagem dos padrões viva como um portal,

um portal para a qualidade,

está relacionado às ações cotidianas das pessoas,

atualmente está esquecida - é importante redescobrir o portal,

importante é desenvolver uma linguagem própria e sensível ao lugar.

... a linguagem nos dá forças para formar o todo,

não se trata de adição, mas de gênese,

definir o projeto no próprio lugar para o qual se projeta (sem desenhar diretamente no papel)

esse caminho é algo que é intrínseco a nós

Jan Gehl

Jan Gehl: arquiteto dinamarquês que fala sobre "usable urban design" ou seja, o desenho urbano feito para o usuário, para as pessoas.
- "I have to feel I arrived in a PLACE I like. I am here. I don't have to go further to other places. I can stay here and enjoy, because I feel good here"
- "If you do it the right way, people can't resist these places".

Através dessas frases eu reestabeleci contato com o que me interessa nesse doutorado: pesquisar as ferramentas necessárias para projetar espaços urbanos à beira-rio, principalmente no que diz respeito à qualidade para o ser humano.

Na útlima conversa que tive com o P., falamos sobre "Planungsmethodik". Sim, isso é importante. Mas o que me interessa são os elementos com os quais eu posso projetar um determinado espaço de forma que ele seja adequado para o homem.

Outras Referências:

1) Christopher Alexander - his central contribution was to create a set of tools to judge beauty: the design patterns. The timeless way of Building.

2) Kevin Lynch - his legacy was to describe elements that make the city's image more vivid and memorable to the city dweller. Orientation. Mental maps of cities. The Image of the City.

3) Gerd-Lothar Reschke - o interior do ser-humano é refletido exteriormente na forma como ele desenha um edifício ou um espaço. Da mesma forma, um dado espaço exerce um efeito sobre o ser humano, tocando o seu interior. É apenas quando essa interação é compreendida e desenhada de uma maneira construtiva que a arquitetura tem valor.